quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Subida do Vulcão Láscar - Chile

Desde as aulas de geologia no primário, que falavam sobre placas tectônicas, magma, tipos de erupções e formação de relevo na Terra sonhava em ver de perto como era um vulcão.

Assim que pintou a oportunidade decidi: tinha que subir um vulcão. Quando disse, no local de montanhistas que organizava subidas aos vulcões, que era Brasileira e morava no Rio de Janeiro, os guias me olharam desconfiados, sem botar muita fé que eu subiria, pois eu vivia numa cidade ao nível do mar, e não estava na melhor das minhas formas físicas.

De todos os vulcões disponíveis, escolhi um vulcão que pudesse ser visitado em um único dia e principalmente, que fosse ativo. Queriam me empurrar a subida ao Cerro Toco, que já é extinto e tem uma subida bem mais curta, mas o fato de não ser um vulcão ativo me fez rechassar a idéia.

Contratei os serviços da Cumbres 6000: as subidas se fazem com no máximo 4-5 pessoas e o guia seria o Patrício, com quem tinha conversado justamente antes de contratar o trekking. Passaram para me pegar às 5hs da manhã no hotel, e o próprio Patrício conduziu o grupo por algumas horas noite adentro numa pickup. Paramos ao lado da laguna Lejía (um lago salgado lindíssimo que forma um verdadeiro espelho rodeado por vulcões) para tomar o café da manhã. 

Laguna Lejía com cadeia de vulcões
Fazendo a aclimatação à altitude ao lado da Laguna "espelho d'água"


O café da manhã foi bem simples, e rolou em pé mesmo. Tinha um pão típico da região chamado "pão pisado" meio dormido sem nada pra passar ou colocar dentro e um chá quente. Infelizmente, a mais de 4 mil metros de altitude, comer um farto café da manhã é altamente desaconselhável pois pode resultar em episódios de vômito pesados. Para chegar ao ponto de partida da caminhada, ainda entramos no carro e rodamos por mais uns 45 minutos em um terreno irregular até chegar à encosta do vulcão.

Após fazer xixi agachada atráz do vehículo num frio desgraçado, começamos a subida por volta de 7h30, levando cada um cerca de 1 litro de água (imprescindível!) e máquina fotográfica na mochila. O terreno tem uma inclinação mediana mas o solo é desagregado, como que de uma terra fina misturada a pedras bem pequenas, o que torna a caminhada difícil. Mas o que mais dificulta a subida é de fato a altitude que faz com que a pessoa se canse extremamente rápido com a falta de oxigênio.

Durante a trilha, é possível ver os picos nevados ao redor, e mais adiante, passa-se por muitos trechos com neve. Para quem nunca viu, será uma oportunidade de se ter um gostinho de como é ver e tocar a neve (dependendo da época do ano, subi em Setembro). Logo depois do primeiro trecho de subida, a trilha se transforma em um zigue zague constante até o cume.

Já no cume
Terreno arenoso

Durante o percurso, teve gente passando mal e o guía estava impressionado com a lentidão do grupo. Ele acabava tendo que subir e descer diversas vezes para incentivar e tentar ajudar os retardatários a respirar melhor e encontrar seu ritmo de caminhada. Importante frisar que paramos diversas vezes, nos hidratamos e comemos barras de cereal, frutas e mini chocolates em pequena quantidade fornecidas pelo guía durante a ascenção.

 
A impressionante cratera soltando fumaça
Ao fundo a Laguna Lejía

Quem passou mal, infelizmente, acabou desistindo nos 2/3 do caminho e teve que voltar sem ver a cratera. O guía, preocupado, acaba acompanhando os que desistem até o carro, e dependendo de onde estão os líderes da trilha, precisa subir de volta. Felizmente, quando ocorreu essa desistência eu já tinha chegado ao cume e por isso pude descer sem a ajuda do guia e liberá-lo pra acompanhar os que não conseguiram prosseguir. Uma pena, pois além de ser uma visão e tanto e representar uma superação pessoal para muitos, o trekking não é barato (paguei 85 mil pesos, o equivalente a 380 reais com o câmbio do momento) e a quantia paga não é reembolsável. Por isso mesmo, quem almejar subir qualquer desses vulcões deve optar por fazer o trekking no último dia de viagem, após ter feito a aclimatação progressiva à altura em diversos passeios em altitudes mais baixas, e lembrar de comer pouco, não ingerir bebidas alcolicas, beber muita água e dormir cedo no dia que antecede o passeio. Contrariamente ao que é propagado no "boca a boca" e nos sites que li, mascar folha ou chupar bala de coca, beber a infusão dessa ou de outras ervas paliativas para o mal de altitude como a Rica-rica e a Tatacoma não é aconselhável para novatos, segundo nosso guía montanhista. Felizmente, não senti nada além do cansaço natural por estar subindo uma ladeira em altitude. 

Patrício relatou que outros turistas que haviam tentado subir o Láscar dois dias antes haviam desistido antes da metade do trajeto, logo não se sinta tão mal se tentar subir e desistir no meio do caminho, pelo menos terá tentado. Aliás, as pessoas que não conseguiram subir no meu grupo tinham 40 anos, o corpo torneado de academia, logo, ser sarado e relativamente jovem não é garantia de sucesso na subida.

Contrariamente ao que se podería pensar, a descida não é moleza. O terreno inclinado constituído de areia e pedras soltas dificulta muito o regresso, e a volta parece bem longa. Com a altitude, é possível que alguns sintam tonteira, o que pode ser assustador numa descida como essas. Mesmo depois de chegar no carro, os desafios relativos à altitude não terminam. No meio do trajeto de volta, comecei a sentir um pouco de tonteira enquanto um dos integrantes do grupo passou muito mal e vomitou repetidas vezes (segundo Patrício, devido a uma diferença muito brusca de altitude quando se anda de carro). Fazendo esse passeio, chega-se ao hotel por volta das 18h30, ou seja, passeio de dia inteiro.

Outros ítens imprescidíveis são protetor solar, protetor labial, papel higiênico, óculos escurosbons calçados de trilha (nesse caso não é necessário uma bota estabilizadora de tornozelo), e estar bem abrigado. No meu caso, usei uma meia calça fio 80 como primeira camada, seguida de uma legging de cotton e de uma legging dry fit como segunda e terceira camadas. A meia de lã que comprei no proprio Atacama serviu perfeitamente pra aquecer pés e canelas. Na parte superior usei uma blusa segunda pele justa também do material de meia calça (que por sua composição sintética retem bem o calor) seguido de uma blusa de algodão por baixo de um polar e de um casaco de esqui. Luvas, cachecol e gorro também são indispensáveis, pois o vento costuma gerar uma sensação térmica muito mais "punk" durante a subida desses vulcões. Apesar de sentir calor durante a subida, bastava parar durante mais de 3 minutos para que o frio aparecesse novamente. Os mais encalorados sempre têm a opção de retirar uma camada interna, por isso é uma boa pedida se vestir no sistema de camadas.

Já descendo

Em suma, a subida não é fácil, principalmente para pessoas que não estão acostumadas com altitude ou sedentárias, mas com material básico (mencionado acima), força de vontade e achando o seu próprio ritmo, é possível chegar ao cume, a 5600 metros de altitude, e ser recompensado com uma vista única da cratera enorme do Láscar com suas fumarolas e cheiro de enxofre.